sábado, 22 de março de 2014

Porque Deus não nos criou perfeitos?



Certamente todos que nos dedicamos à honrosa tarefa de coordenar Grupos de Estudos, vez por outra nos deparamos com perguntas que, invariavelmente, nos colocam nas chamadas “saias justas”. Uma dessas ocasiões aconteceu quando esta pergunta foi lançada, em pleno Estudo do Livro dos Espíritos. Apesar de, naquela circunstância, estar fora do contexto, não é, absolutamente, uma pergunta sem propósito, pois uma certa postura questionadora é perfeitamente cabível e até desejável. Foi pondo em cheque padrões estabelecidos que a maioria de nós, Espíritas, chegou até a Doutrina. O próprio Codificador nos revela um pouco dessa rebeldia construtiva ao adotar uma filosofia contestadora: “Disse um filósofo que, se Deus não existisse, fora mister inventá-lo, para felicidade do gênero humano. Outro tanto se poderia dizer sobre a pluralidade das existências.” (A. Kardec – O Livro dos Espíritos - cap. V)  
Mas, voltando à pergunta, afinal, porque Deus não nos criou perfeitos? Sem esforços, sem problemas, sem a necessidade de passar tantos milhões de anos evoluindo a passo de tartaruga, enfim, evolução instantânea num passe de mágica. De certa forma, para nós, comodistas inveterados, isso seria uma maravilha, sem sombra de dúvida! No entanto, naquele momento em que a pergunta foi feita no Grupo de Estudos, nos parecia muito mais uma incômoda situação e obviamente procuramos nos livrar dela o mais rápido possível. Tateando no escuro, nossa resposta relacionava vários motivos: porque o universo é dinâmico e exige que tudo se movimente num sentido ascensional; ou porque não há privilégios perante a Divindade; ou mesmo porque, como imortais, evitamos o tédio cuidando da nossa evolução através da eternidade... Resultado: pergunta respondida, satisfação geral e, assim, questão resolvida. Faltou somente um detalhe. O que fazer com aquela voz interior que nos diz que estamos deixando escapar alguma coisa? Bem, a solução mais natural é dar a ela ouvidos interiores. E foi assim que, mais tarde, a Espiritualidade enviou, de forma intuitiva, a resposta para a questão, como uma verdadeira explosão de luz. E então, nossa primeira reação foi: como não pensamos nisso antes? É praticamente como aqueles truques de mágica, que depois que sabemos como são feitos, quase perdem a graça. Ou seja, a simplicidade da resposta é basilar: não somos criados perfeitos, porque a perfeição instantânea é um paradoxo. Para facilitar o entendimento, imaginemos o Criador preparando a receita de um ser perfeito: benevolência, paciência, sabedoria, bondade, conhecimento, virtudes e mais virtudes, enfim, todos os ingredientes em grau máximo. Ao final, “voilà”: um ser ainda imperfeito! Mas como? A Inteligência Suprema do Universo desta vez falhou? É ai que entra o componente gerador do paradoxo. Há uma virtude que nem mesmo o Pai Celestial poderia dar a esse hipotético ser perfeito: O MÉRITO DA CONQUISTA! Por esta razão, o Espírito Emmanuel, no livro O Consolador, cita várias vezes uma Lei Divina muito pouco lembrada: a Lei do Esforço Próprio. Sabemos que a perfeição nos aguarda, sem a menor dúvida. Mas o único caminho que nos leva até ela passa pela aquisição gradativa de cada ínfimo detalhe que irá formar o magnífico conjunto final. Portanto, trabalho é Dádiva Divina, tempo e espaço são as nossas ferramentas. Mãos à obra!


Carlos Alberto Ferreira da Costa

quinta-feira, 20 de março de 2014

Meio de cultura para egos.





Quem nunca teve oportunidade de observar trabalhadores do Movimento Espírita em momentos diferentes de suas atividades? Ora atuando como Expositores ou Coordenadores de Grupos de Estudos, ora participando de reuniões administrativas ou treinamentos em alguma área de trabalho, oferecidos por Casas Espíritas ou pelas Federativas? Em certos casos, a disparidade na personalidade é tão evidente que salta aos olhos. Diríamos, sem sombra de dúvida, que parecem até pessoas diferentes. E, certamente, o são, como diria a Psicologia ao classificar as várias “personas” ou máscaras, que todo ser humano assume de acordo com a situação que vivencia em diferentes momentos. Então, se é assim mesmo, qual deles é o verdadeiro? O palestrante e/ou coordenador de voz aveludada que você ouve e imediatamente se apaixona ou o enérgico defensor de suas posições nos encontros administrativos e/ou de treinamento? Haveremos de concordar: todos somos muitos, assim como o famoso espírito Legião. E todas as nossas várias faces são verdadeiras, porque representam cada uma um traço diferente de nossas personalidades seculares. O desafio é promover o diálogo entre as partes para que o todo seja beneficiado. Em outras palavras, permitir que a fala da humildade seja a primeira a ser ouvida, abafando os argumentos do ego, não importa qual seja a situação. Antes de tudo, devemos considerar que a própria estrutura do Movimento Espírita, promovendo a exposição ao invés da imposição, é um grande facilitador para o engrandecimento de egos. Não por culpa da organização, mas sim pelo simples fato de que ainda não estamos devidamente preparados para a liberdade. Somos aqueles que comem melado pela primeira vez. Antes, nos diziam como fazer tudo: que roupas usar nos cultos religiosos, o comprimento de nossos cabelos, de nossas saias, quais eram nossas poucas obrigações para ir para o céu e por ai afora. Nosso acesso às camadas superiores da hierarquia religiosa era limitadíssimo e muito comumente ligado a um sacerdócio. Agora, no seio da mãe-doutrina espírita, praticamente todos os degraus nos são facultados e ainda somos estimulados a galgá-los.  Com tanta facilidade, se não segurar o ego, ele subirá sempre uns dois ou três degraus na nossa frente. Ainda mais quando constatamos que ainda estamos longe da meritocracia plena e apenas quebramos o galho com a “conhecimentocracia”. Ou seja, saber mais é “status” e substitui, na falta deste, o merecer mais. Não por acaso, a Espiritualidade Superior nos envia contínuos e insistentes alertas para nos observarmos a nós mesmos e identificarmos possíveis invasões de egos inflados em campos de trabalho da humildade. O Espírito Vianna de Carvalho (Luzes do Alvorecer – psicografia de Divaldo Pereira Franco, Espíritos Diversos, Salvador (BA), 1996, Ed. Leal) nos dá um recado muito claro: “O Espiritismo resiste aos seus oponentes, (...) e aos seus adeptos invigilantes, que se deixam fascinar pela vaidade, buscando promoção do ego, projeção da personalidade doentia, através da sua extraordinária contribuição.” Observemos que o Espiritismo acaba tendo que resistir, além de aos oponentes, também aos seus próprios adeptos invigilantes. Que encontrarão neste meio, certamente, um ambiente muito propício para favorecer o desenvolvimento de grandes colônias de seus egos vaidosos e doentios. Mas, não esqueçamos: todos temos também as sementes de trigo, além das de joio. Está na hora de oferecermos nossa outra face ao Movimento Espírita. Em troca de muita luz e terreno fértil para um crescimento sustentável por toda a eternidade.  

Carlos Alberto Ferreira da Costa